Do voluntariado em Odontologia à preservação ambiental

Do voluntariado em Odontologia à preservação ambiental

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Amor ao próximo, criatividade e empreendedorismo: Luciano Mazitelli constrói uma jornada de sucesso.

Desde antes de se formar em Odontologia, o cirurgião-dentista Luciano Mazitelli, de São Paulo, já se engajava em projetos sociais como voluntário. Um ano antes de se graduar, ele teve a oportunidade de viajar para a Amazônia para participar de uma ação de voluntariado e afirma ter ficado mais impressionado com o povo que mora na floresta do que com a própria floresta. Durante alguns anos, ele participou de diversos projetos sociais que levam serviços odontológicos àquela região, sem se fixar em algum exclusivamente, principalmente porque isso facilitava a conciliação das datas das expedições com sua agenda. “Eu me encaixava dentro dessas organizações para exercer meu papel como cirurgião-dentista. Tirava férias uma ou duas vezes por ano e passava uma a duas semanas na floresta amazônica, dependendo do programa que eu estivesse participando”, conta, explicando que fez isso durante muito tempo.

A partir de 2022, Luciano Mazitelli fundou sua própria organização, o Instituto de Saúde Sustentável (Isas), que presta serviço no Vale do Javari, no norte do Amazonas e região do território indígena do Xingu. O projeto surgiu da parceria que ele fez com Felipe Martins, criador de conteúdo digital na área de impacto socioambiental, que uniu seu conhecimento em Geografia e Logística para atendimento social no Xingu com a experiência de Mazitelli em gestão. Profissionais de outras áreas aderiram ao projeto de forma voluntária, responsabilizando-se pela gestão administrativa e financeira. Todas as vezes que visitava a região, um pensamento sempre o perseguia: “O que eu posso fazer para deixar algum benefício para essas pessoas depois que eu sair daqui?”.

Apesar do benefício que proporcionava, distribuindo escovas de dente e creme dental, Mazitelli se sentia incomodado com o lixo não biodegradável que essas ações produziam. “Não há como não se envolver com as questões ambientais quando participamos de programas sociais nesses lugares”, afirma.

Pastilhas de higiene bucal Em um primeiro momento, o cirurgião-dentista pensou em levar uma pasta de dentes gigante e distribuir o conteúdo em potes de vidro que poderiam ser preenchidos todas as vezes que ele voltasse. Por diversas razões, a ideia não deu certo. Assim, Mazitelli pensou em criar um produto em pó para a higiene bucal. “Pesquisei na internet e vi que havia vários produtos em pó. Levei em uma das expedições, mas virou uma bagunça, uma meleca”, relata.

Como normalmente ficava acampado quando ia para a floresta amazônica, Mazitelli costumava buscar dicas de como carregar apenas o essencial para não acumular peso e nem volume, mas preservando o conforto. Foi quando viu um vídeo em que uma moça colocava bicabornato de sódio com um pouco de pasta de dente em uma latinha, chacoalhava e o produto se dividia em pequenas balinhas, que ela levava para os acampamentos em saquinhos. E, então, veio a grande ideia: criar um comprimido de pasta de dente.

Desse momento em diante, Luciano Mazitelli se dedicou a fazer estudos sobre como produzir os comprimidos. Pesquisou em universidades nacionais e internacionais, leu inúmeros artigos, investigou o que havia de semelhante no mercado em outros países e, em um congresso de Odontologia realizado nos Estados Unidos, em 2019, ele conheceu uma pastilha para higiene bucal e viu que seu sonho fazia sentido.

Seria possível levar essa solução ecológica e prática aos ribeirinhos do Rio Amazonas, e até colocar esse tipo de produto no mercado brasileiro. “Eu comprava os insumos para produzir a base, adquiri uma compressora que transforma esse composto em pastilhas e comecei a produzir os comprimidos dentro do meu consultório”, relata o cirurgião-dentista. Em seguida, Mazitelli contratou um farmacotécnico para dar continuidade ao projeto e ajudá-lo a finalizar a fórmula. Ele explica que a composição das pastilhas é vegana, contendo apenas produtos naturais, sem conservantes e sem produtos de origem animal. Ao colocar a pastilha na boca, em contato com a saliva ela forma uma espuma que facilita a escovação.

A pandemia de Covid-19 causou um atraso na produção industrial do produto, mas Mazitelli aproveitou esse tempo para elaborar outros detalhes necessários ao lançamento das pastilhas dentais e criação da marca Sana Green. Nesse primeiro momento, o produto tem um custo final elevado, mas o cirurgião-dentista acredita que, conforme o consumo aumentar, será possível alcançar preços mais acessíveis.

As pastilhas têm composição vegana, contendo apenas produtos naturais e sem conservantes.


As pastilhas são acondicionadas em frascos de vidro com 70 unidades e também podem ser adquiridas em refis, completando o conceito de consumo sustentável, que confere valor agregado ao produto. “Parte do lucro da empresa é utilizada para a produção de mais pastilhas e distribuição em comunidades ribeirinhas no Amazonas”. Ele conta que a primeira distribuição foi realizada na mesma comunidade que ele visitou na primeira vez que esteve na região. Em menos de dois anos de existência, o Isas já realizou quatro expedições de assistência médica e odontológica no Amazonas, e o perfil do instituto no Instagram (@isas.green) já conta com mais de 17 mil seguidores. “O diferencial dos médicos e cirurgiões-dentistas que integram o projeto é que eles são especialistas. Normalmente, o atendimento de saúde disponível nesses lugares é feito por clínicos gerais. Nós levamos cardiologistas, ginecologistas, pediatras e diversas especialidades odontológicas”, afirma Mazitelli.

As ações acontecem sempre dentro do sistema de saúde local, utilizando a infraestrutura já disponível. O cirurgião-dentista explica que no Xingu, por exemplo, eles se instalam no Disei (Distrito Sanitário Especial Indígena) – órgão do Governo Federal responsável pela atenção à saúde dos povos indígenas –, que faz uma triagem prévia e reúne nesse local todos os indivíduos que precisam de algum tipo de atendimento. Alguns viajam até seis dias em um barco para receber atendimento. “Sempre estudamos a região, vemos o que o poder público local pode nos oferecer e entramos com os insumos, medicamentos e a mão de obra especializada de médicos e cirurgiõesdentistas”, detalha.

Luciano Mazitelli revela que, recentemente, o Isas conquistou o apoio de uma empresa farmacêutica multinacional, que vai garantir o envio de R$ 100 mil em medicamentos para os povos do Vale do Javari na próxima expedição, prevista para o mês de março. Os atendimentos acontecerão em uma unidade básica de saúde fluvial. “O posto vai descendo o rio e parando nas comunidades para fazer os atendimentos”, explica, dizendo que a previsão é de que sejam realizados mais de 500 atendimentos em uma semana. “Cuidar dos povos originários do Brasil é cuidar da mata, é cuidar da floresta e é cuidar do nosso país”, finaliza.