Odontologia militar: cirurgiões-dentistas que atuam nas Forças Armadas são concursados e, entre as vantagens da carreira, podem se aposentar com salário integral.
Seja no Exército, Marinha ou Aeronáutica, a carreira de cirurgião-dentista das Forças Armadas brasileiras pode ser considerada uma das mais estáveis opções de mercado de trabalho, tanto para os que estão iniciando na profissão como para os que já contam com alguns anos de experiência. Estabilidade de emprego, bons salários, benefícios e a possibilidade de aposentadoria com valor integral após 35 anos de serviço estão entre as principais vantagens elencadas por quem escolheu trilhar esse caminho.
O Capitão Pedro Dourado, cirurgião-dentista do Exército Brasileiro há nove anos, explica que o candidato pode escolher entre dois caminhos para ingressar como profissional da saúde nas Forças Armadas: ser militar de carreira ou temporário.
Os militares de carreira prestam um concurso e cumprem 35 anos como oficiais. Quando são aprovados nesse processo seletivo, imediatamente fazem o Curso de Formação de Oficiais, do qual já saem com a patente de 1º Tenente. Com o passar do tempo, esse oficial recebe promoções e um escalonamento de patentes. Sete anos após seu ingresso, é promovido a Capitão; depois de dez anos nesse posto, torna-se Major. Após seis anos, é promovido a Tenente-Coronel e, por fim, seis anos depois chega a Coronel, que é a última patente para um cirurgião-dentista, quando já está próximo da aposentadoria.
Os militares temporários passam por um processo seletivo e, quando aprovados, assinam um contrato de um ano, podendo ser renovado até que complete oito anos em qualquer uma das Forças Armadas. Esse profissional ingressa como aspirante a oficial, depois adquire a patente de 2º Tenente e, por último, 1º Tenente.
“As promoções implicam em aumento das responsabilidades, além de um incremento no salário. Os militares temporários têm algumas responsabilidades administrativas também, como sindicâncias, processos licitatórios, participação em formaturas, entre outras”, esclarece o Capitão Dourado.
O limite de idade para prestar o concurso para Oficial de Carreira é de 32 anos, e para participar do processo seletivo para Oficial Temporário é de 40 anos. Normalmente, há mais vagas para oficiais temporários do que para os de carreira. E a melhor forma de se informar sobre essas oportunidades é por meio dos sites oficiais das Forças Armadas, que anunciam a realização dos concursos e processos seletivos.
Por serem cargos públicos, os salários dos oficiais são fixos e divulgados pelas Forças Armadas. Atualmente, por exemplo, um cirurgião-dentista militar temporário é contratado com um soldo de R$ 7.315,00. O 2º Tenente recebe R$ 7.490,00 e o 1º Tenente recebe R$ 8.245,00 por mês.
O Capitão Dourado cumpre uma carga horária de seis horas por dia, 30 horas semanais. Não trabalha nos finais de semana, mas pode ser escalado para ficar de plantão ou sobreaviso se for necessário atender fora do horário de expediente.
Direitos e deveres
Ao ingressar na carreira militar, os profissionais de saúde têm entre seus direitos, além da aposentadoria integral, 13o salário, férias, assistência médica e odontológica extensiva a seus cônjuges e dependentes, ajuda de custos em alguns casos de transferência de moradia, vagas para os filhos nos colégios militares e também cursos de especialização e atualização profissional oferecidos pelas Forças Armadas.
Em contrapartida, os deveres desses profissionais abrangem uma série de exigências, a começar pelo Curso de Formação de Oficiais, que tem duração de nove meses e é obrigatório a todos os profissionais aprovados nos concursos.
Atualmente, o curso é realizado em Salvador (BA) e tem como objetivo ensinar bases militares, como marchar, prestar continência, respeito aos símbolos nacionais, entre outras disciplinas. As vagas são disponibilizadas a profissionais de gênero masculino e feminino, e não é necessário que os homens tenham cumprido serviço militar aos 18 anos.
Depois de concluir o curso, o oficial é classificado para trabalhar em algum lugar do Brasil. Essa escolha leva em consideração as opções previamente informadas pelo candidato, que pode elencar uma lista com 25 possibilidades de locais onde gostaria de atuar dentro do País.
A primeira cidade onde o Capitão Dourado trabalhou, logo após concluir o Curso de Formação de Oficiais, foi Uruguaiana (RS), onde ficou por dois anos. Depois, foi transferido para Maceió (AL), que era a terceira opção de sua lista e, após dois anos, mudou-se para São Paulo, onde trabalha atualmente e era a primeira cidade entre suas opções.
Os oficiais podem ser transferidos a qualquer momento. Todos os anos, eles preenchem um Plano de Movimentação no qual o Exército apresenta as opções de locais e os profissionais as enumeram de acordo com seus interesses, necessidades ou conveniência, e o comando avalia se há ou não necessidade de transferência do oficial-dentista.
“Não é um processo impositivo, mas sim estudado para atender e equalizar as necessidades do oficial e do Exército. Se houver transferência, o oficial recebe um auxílio para se mudar com toda a família. Há colégios militares em diversas partes do País para os filhos em idade escolar, e essas instituições de ensino seguem o mesmo planejamento acadêmico, de forma que os alunos não perdem conteúdo com as eventuais mudanças”, detalha o capitão.
O bom condicionamento físico é outra exigência para os oficiais-dentistas ou de qualquer outra área da saúde dentro das Forças Armadas. No Exército, três vezes por ano eles passam por testes de aptidão física e precisam estar bem preparados. Os profissionais que prestam serviço em quartéis precisam frequentar as aulas de Educação Física. E aqueles que estão locados em outras unidades devem buscar esse condicionamento por conta própria.
O condicionamento pode variar de acordo com a área das Forças Armadas da qual o oficial-dentista faz parte. Na Marinha, por exemplo, é fundamental que os profissionais tenham competência em natação.
Ainda de acordo com o Capitão Dourado, os oficiais-dentistas passam por uma prova de tiro anualmente no Exército, e não precisam necessariamente participar dos treinamentos durante o ano, a menos que prestem serviços dentro de algum quartel.
Qualidade e alto padrão
Os profissionais da Odontologia que decidem seguir a carreira militar precisam já ter especialização em alguma área para prestarem concurso. Depois de aprovados, e já em serviço, o Exército apoia cursos de atualização e especialização, além de oferecer estágios, que atualmente são realizados no Rio de Janeiro. Esses cursos têm duração de duas a três semanas.
O Exército brasileiro oferece atendimento em toda as áreas de especialização da Odontologia, com exceção dos procedimentos estéticos e de Harmonização Orofacial. A exigência de especialização dos profissionais e o incentivo à atualização têm como principal objetivo oferecer um serviço de qualidade aos usuários.
Os oficiais que têm direito ao atendimento odontológico são os militares da ativa, da reserva, cônjuges, pensionistas (cônjuges de militares falecidos) e dependentes (filhos até 24 anos, caso estejam cursando faculdade, ou até 18 anos se não estiverem em curso superior).
Os oficiais-dentistas podem atuar em organizações militares de saúde (OMS), quartéis, postos médicos, policlínicas, hospitais de guarnição, hospitais militares de área. Algumas dessas instituições são centros de referência em saúde, como o Hospital Central e a Odontoclínica do Exército, ambos no Rio de Janeiro.
O Capitão Dourado afirma que o aparato tecnológico oferecido aos profissionais de saúde que atuam nas Forças Armadas é de primeira linha, com recursos e equipamentos modernos e constante atualização técnica para os procedimentos.
Uma decisão acertada
O Capitão Pedro Dourado afirma que a escolha de ter seguido a carreira militar como cirurgião-dentista tem correspondido às suas expectativas. “Gosto muito do que eu faço. No Exército, eu tenho a oportunidade de exercer uma Odontologia que dificilmente eu conseguiria em um consultório particular”, relata.
O oficial-dentista se formou pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) em 2012. No ano seguinte, cursou especialização em Prótese Dentária e, em 2014, passou no concurso para Militar de Carreira no Exército. Já como oficial, especializou-se também em Implantodontia.
Influenciado pelo sogro, que é militar da Marinha, e com apoio da esposa, também cirurgiã-dentista, o Capitão Dourado conta que a estabilidade da carreira e os benefícios profissionais e pessoais foram os principais pontos que o fizeram tomar essa decisão.
O oficial-dentista aponta o fato de poder trabalhar com especialistas de diversas áreas nas clínicas odontológicas como uma das principais vantagens. “Levando em consideração que todos passaram por um processo seletivo rigoroso, já há um funil de qualidade. Quando eu preciso discutir sobre qualquer caso de paciente com outro profissional, sempre haverá alguém gabaritado por perto”, considera.
Por terem um salário fixo, independentemente dos procedimentos a serem realizados, a prestação de serviços odontológicos não depende de negociação de valores. “Com a infraestrutura que temos à disposição, podemos oferecer aos pacientes o que acreditamos ser o melhor para cada um. Isso nos dá uma sensação de realização profissional enorme”, finaliza.
O cirurgião-dentista Roger Nascimento Gonçalves, de São Paulo, prestou serviços ao Exército como militar temporário durante oito anos, período que concluiu em 2011. O profissional da Odontologia afirma que a experiência possibilitou aprendizados que o transformaram pessoal e profissionalmente, e que leva para toda a vida.
Quando ingressou no Exército, Gonçalves tinha especialização e mestrado em Implantodontia, e atendia em seu próprio consultório que, segundo ele, já contava com um bom movimento de pacientes. O cirurgião-dentista ficou sabendo sobre a oportunidade de trabalhar para as Forças Armadas por recomendações de colegas de profissão. “Naquela época, apesar de já termos acesso à internet, a comunicação digital não era tão facilitada como hoje, e essas opções de mercado não eram tão divulgadas”, comenta.
Gonçalves considera a possibilidade de trabalhar como oficial-dentista das Forças Armadas Brasileiras uma grande oportunidade. “Os salários são bons, os benefícios também, e tanto o processo hierárquico como os direitos e deveres são os mesmos de um oficial de carreira”, descreve.
Ele foi contratado como implantodontista, fazendo próteses e cirurgias. “A área de Saúde é levada muito a sério no Exército, assim como a Educação. Os investimentos em infraestrutura e tecnologia de ponta são altos, de forma a oferecer serviços de qualidade e excelência aos beneficiários”, declara.
Com isso, o cirurgião-dentista afirma que o contato com outros profissionais altamente qualificados e a possibilidade de trabalhar com um aparato de primeira linha, desde os equipamentos ao mobiliário, acrescentaram a ele muito mais experiência e desenvolvimento técnico em sua área.
Gonçalves explica que a seleção dos oficiais-dentistas para o serviço temporário é feita principalmente com base no currículo dos profissionais. Não há uma prova de concurso, como no caso dos oficiais de carreira, mas o critério de seleção é bastante exigente. Ele também precisou fazer o Curso de Formação de Oficiais, entrou como aspirante e saiu como 1º Tenente.
Durante o período em que trabalhou para o Exército, o especialista continuou mantendo seu consultório particular, uma vez que a instituição não exige exclusividade dos oficiais-dentistas, e a carga horária que ele cumpria permitia essa disponibilidade.
Segundo Gonçalves, a Odontologia é uma das poucas áreas cujos profissionais têm a permissão do Exército para também trabalhar fora da instituição. “Eles entendem que é uma forma do cirurgião-dentista adquirir ainda mais conhecimento e experiência, beneficiando o atendimento nas Forças Armadas com isso”, diz.
“Principalmente no caso dos temporários, é importante ter em mente que é preciso se organizar para continuar no mercado de trabalho quando o período de contrato com o Exército terminar. Se o profissional focar apenas em sua atuação dentro das Forças Armadas, em algum momento vai ficar sem aquele trabalho, sem o salário e sem os benefícios”, alerta.
Os contratos temporários são renovados anualmente, e tanto o profissional quanto o Exército podem optar pela não renovação. No entanto, em geral, essa relação contratual vai sendo renovada até atingir o prazo máximo de oito anos de prestação de serviços.
Os oficiais temporários que desejam seguir carreira também podem prestar os concursos. “É preciso estudar e se preparar bastante. As provas exigem muito conhecimento geral e de matérias básicas na área de saúde, como Biologia, Fisiologia, entre outras, e com alto nível de complexidade”, comenta.
Gonçalves optou por não se tornar um oficial de carreira porque, além de já ter seu próprio consultório, já havia formado família quando encerrou seu período no Exército. Desta forma, seria complicado submeter a esposa e filhos às constantes mudanças de local de trabalho que acontecem frequentemente no caso dos profissionais de saúde concursados. Ele explica que os temporários sempre permanecem no mesmo local até o término da relação contratual.
Trabalhar no serviço público, conhecer o funcionamento do Exército Brasileiro, aprender sobre o respeito à hierarquia, exercitar disciplina e aflorar um sentimento genuíno de amor à pátria estão entre as maiores lições apontadas por Gonçalves em sua vivência como oficial-dentista, e que ele afirma que ficarão impressas em sua vida para sempre.