Cirurgia bariátrica: os impactos nas reabilitações com implantes dentários

Cirurgia bariátrica: os impactos nas reabilitações com implantes dentários

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Recente estudo traz descobertas para minimizar intercorrências da instalação de implantes em pacientes que já passaram por cirurgia bariátrica.

Por Leandro Duarte

Os profissionais da Odontologia já têm conhecimento das alterações metabólicas e nutricionais após a cirurgia bariátrica, que podem afetar o metabolismo ósseo e periodontal, interferindo na osseointegração e longevidade dos implantes dentários. A partir dessas informações, uma equipe de especialistas em Periodontia e Implantodontia produziu um estudo revelador que ajudará cirurgiões-dentistas a conduzirem tratamentos com próteses dentárias e outros procedimentos em pacientes na pós-gastroplastia.

Com o título “Impactos da CB em reabilitações com implantes dentários”, a pesquisa foi realizada em 2023 com autoria de Isabela Jeronimo do Nascimento (especialista em Implantodontia pela Faoa/APCD) e coautoria de Gabriela Dias Rosso dos Santos (especialista em Implantodontia pela Faoa/APCD), José Camilo Furlani (especialista em Periodontia pela Fundecto e mestre em Ciências pelo ICB-USP), Hid Miguel Junior (doutor em Implantodontia pela Unicsul e mestre em Implantodontia pela São Leopoldo Mandic) e Carlos Beltrão (especialista em Prótese Dentária e em Implantodontia pela APCD, e mestre em Ciências da Saúde pela Unip).

A Sorrisos Brasileiros conduziu uma entrevista com Camilo Furlani, que respondeu em conjunto com sua equipe, para esclarecer como as conclusões do estudo podem ajudar na orientação de cirurgiões-dentistas que cuidam de pacientes submetidos recentemente a uma intervenção bariátrica.

Qual o alerta que esse estudo traz à comunidade odontológica?
O objetivo deste artigo foi elucidar como alterações no período pós-cirurgia bariátrica podem impactar na osseointegração e longevidade dos implantes dentários. A ideia é alertar o cirurgião-dentista a prestar atenção nos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica e que buscam tratamento reabilitador mediado por implantes, minimizando intercorrências e elucidando a interferência da condição sistêmica na cavidade oral.

Como seria o longo e árduo caminho para que esse estudo produza um protocolo restritivo sobre aqueles que estão em processo de reabilitação com implantes dentários?
Quando se fala em alterações sistêmicas, a maioria das comorbidades vem acompanhada de guidelines que permitem que, em ambiente ambulatorial, seja possível a atuação do cirurgião-dentista com menos riscos e maior segurança. No caso da cirurgia bariátrica, faltam estudos que realmente comprovem a relação entre o procedimento e a perda de implantes dentários. Este artigo permitiu que concluíssemos que tanto a obesidade prévia à cirurgia bariátrica quanto as modificações metabólicas que a gastroplastia gera nos pacientes podem alterar mediadores imunológicos e inflamatórios, culminando em alterações bucais que interferem negativamente na cicatrização e metabolismo ósseo. Toda condição sistêmica e/ou medicação que interfira no metabolismo ósseo deve ser criteriosamente avaliada pelo implantodontista, uma vez que pode ser a precursora de uma falha na osseointegração e longevidade do tratamento.

A cirurgia bariátrica oferece risco apenas àqueles que estão em processo de cicatrização de implantes dentários ou também aos pacientes que já fazem uso das próteses há mais tempo?
A cirurgia bariátrica modifica completamente a anatomia e fisiologia do estômago e intestino do paciente. Então, esse paciente que já foi um obeso grave pode ter sido portador de alterações sistêmicas importantes que devem ser criteriosamente avaliadas pelo cirurgião-dentista responsável. A gastroplastia gera deficiência na absorção de nutrientes, incluindo vitaminas C e D, bem como ferro e cálcio, e também conta com o aparecimento de refluxo gastroesofágico e episódios de vômito. Até que o paciente consiga estabilizar o seu peso, tudo isso ocorre de forma mais acentuada. Portanto, antes dessa estabilidade maior, há chance de ocorrer falha na osseointegração. Agora, falando de pacientes que já possuem implantes dentários instalados e próteses sobre implantes, o acompanhamento deve ser criterioso no sentido de avaliar com exames de imagem a perda óssea e estar atento à higienização e sinais de peri-implantite, já que há maiores chances de desenvolvimento de doença periodontal.

Como o cirurgião-dentista deve proceder com um paciente recém-operado de cirurgia bariátrica em tratamento de implantação de prótese dentária? Essa atenção precisaria envolver a participação efetiva de um nutricionista e a realização periódica de exames para aferir os níveis de cálcio, vitamina D, ferro, entre outros?
O primeiro passo é realizar um exame intraoral para verificar como é o controle de biofilme deste paciente, se possui gengivite, se já tem doença periodontal instalada (motivo da perda do elemento dentário), avaliação de fluxo salivar, presença de cáries, desgaste dentário, mau hálito, erosão e sensibilidade. Com essa avaliação, fica mais fácil planejar o que esse paciente precisa para que essa cavidade bucal esteja menos contaminada e menos propensa a complicações durante o processo de instalação de implantes. A solicitação de exames de imagem tem a finalidade de verificar a perda óssea, observar a forma das trabéculas ósseas, sinais de osteoporose e o tipo de osso com o qual vamos nos deparar. A solicitação de exames laboratoriais também nos permite verificar se diz respeito a um paciente anêmico, por exemplo. Nos casos de bariátrica recente, o cirurgião-dentista pode solicitar hemograma, coagulograma, glicemia, paratormônio (PTH), cálcio iônico, ferro, vitaminas C e D, e complexo B. O contato com os médicos, nutricionistas e psicólogos da equipe que acompanham o paciente ajuda o implantodontista a entender em que fase ele está do tratamento, se é possível adaptar a dieta, por exemplo, para que ela seja rica em nutrientes para melhora da qualidade óssea durante o pós-operatório de instalação de implante, recomendações médicas, entender o tipo de cirurgia à qual ele foi submetido. Esse contato multiprofissional ainda não é a realidade da rotina de um consultório odontológico, mas faz a diferença quando manejamos pacientes sistemicamente comprometidos.

Como seriam os cenários de um quadro grave com complicações e rejeição de um implante dentário no pós-operatório de bariátrica? Há risco de óbito?
É preciso entender que o paciente submetido à cirurgia bariátrica tem alterações imunes e outras significativas de ordem metabólica, principalmente no metabolismo ósseo e nas fibras de colágeno. Se o cirurgião-dentista instala o implante e, mais ou menos quatro meses depois, vê mobilidade, supuração ou dor, ele pode estar perdido por falha na osseointegração, avaliada de forma clínica. Mas é necessário frisar: só a condição sistêmica pós-bariátrica faz o paciente perder o implante dentário? Não necessariamente, pois a falha do implante depende de outros fatores, como posicionamento, biodisponibilidade óssea, colocação de carga em implantes sem estabilidade primária, se o paciente recebeu suporte do profissional no pós-operatório, se houve prescrição de antibiótico para evitar infecções na área operada, se todas as medidas de biossegurança e esterilização foram cumpridas, dentre outras situações. A instalação de implantes não oferece risco de óbito. O maior perigo em intervenções cirúrgicas em âmbito ambulatorial é a falta de controle e prevenção de infecções que podem impactar na saúde sistêmica do paciente. Na temática da cirurgia bariátrica, a perda de implante acarreta uma maior morbidade, pois o paciente precisará passar por outras intervenções para seguir com o processo de reabilitação.

Há contraindicação para o procedimento de implante dentário nos pacientes recém-operados de uma intervenção bariátrica?
Não. A partir dessa revisão da literatura, verificou-se que o cirurgião-dentista deve manejar com cautela esse tipo de paciente, principalmente os recémoperados. As consequências metabólicas melhoram a qualidade de vida do paciente que sofria com os males da obesidade, mas, em contrapartida, interferem diretamente na qualidade do tecido ósseo, conjuntivo e na capacidade de tamponamento salivar. Se o cirurgião-dentista atuar de forma multidisciplinar em conformidade com a equipe médica e nutricional, se realizar de forma criteriosa o exame intraoral, solicitar exames complementares, reforçar o controle de biofilme e eliminação de focos infecciosos previamente, a intervenção cirúrgica de instalação de implantes gera menores chances de falha na osseointegração. O melhor momento de intervir coincide com a fase de estabilização do peso. Diante de um caso de reabilitação finalizada e mediada por implantes, as consultas de manutenção e acompanhamento se fazem necessárias para prevenir a peri-implantite e garantir a longevidade dos implantes.